sábado, 22 de janeiro de 2022

Flambarda - A Detetive Elemental #59

A jovem vai até o banheiro, completamente acordada, ela não sabe exatamente o que fazer, mas ela se olha no espelho buscando alguma resposta, seja em si mesma, ou seja nos produtos cosméticos na pia, para os quais ela olha em seguida. As fagulhas elementais fluindo de um lado para o outro também são fonte de informação e parecem reagir ao próprio nervosismo dela que tem dificuldade para se controlar e entender a situação. Ela procura o telefone no banheiro, mas ela está nua, não há bolsos, e portanto precisa olhar a mochila onde ela geralmente larga o telefone. Não está lá, ela lembra que chegou tarde da noite e simplesmente jogou o celular na gaveta, e lá estava com as mensagens de Fabiana, Fernanda e Sofia.

"Que se fodam elas" - Pensou por um instante. Sua vida já estava conturbada o suficiente e ela precisava achar um jeito de colocar as coisas nos trilhos, ela pegou o celular procurando o número daquele cara que conversou com ela a pedido de sua mãe, um dos conselheiros da sociedade druídica. Infelizmente ela não havia anotado e ia precisar de outra forma pra falar com ele. Por alguma razão, aquele homem sábio que já lhe deu conselhos no passado, e foi indicado pela própria Jéssica. Algum borogodó esse cara tem. - "Será que minha mãe deu pra ele em algum momento?" - Ela pensou mas rapidamente desfez. Não fazia sentido pensar nesse tipo de coisa agora. O objetivo era outro.

Ela prontamente começou a se arrumar, e por se arrumar, entenda colocar uma camisa preta, calça jeans, all star, meter o rabo de cavalo no cabelo, e pôr a mochila nas costas. O destino era certo, a sede da SDRJ na Tijuca. Ela era uma Arcanista agora, teoricamente da facção rival, mas ela não estava nem aí pra isso. Só queria ajuda, ajuda de alguém que provavelmente sabia muito mais do que ela sobre o mundo.

Ao chegar na cozinha, sua mãe a chamou para o café da manhã. O café parecia reforçado, como se Jéssica estivesse tentando preparar sua filha pra algum evento especial. a mesa tinha pão, café, biscoito, manteiga, chocolate, queijo, presunto, sucrilhos, ovos... parecia café da manhã de hotel. Flambarda está surpresa com a quantidade de comida e com as expressões de sua mãe, o que a faz puxar a cadeira com um certo receio. A matriarca, em contra partida, está já sentada esperando a filha.

- Oi... Mãe?
- Oi filha.
- Que que houve aqui?
- Café da manhã reforçado!
- Que?
- É, você voltou tarde, achei que fosse acordar com bastante fome.
- Mãe... - Ela hesitou por um instante - ...Isso não tem nada a ver com a alabarda não, tem?
- Bem....
- Tem.
- Ok! Tem! Eu tô preocupada, tá legal! - Disse Jéssica, gesticulando bastante.
- Mãe!
- Você tem uma porra de uma luva que pega fogo e que conjura uma labareda do cu!
- É uma alabarda, mãe.
- Essa merda aí!
- Mãe, eu já entendi que eu fiz uma grande merda na minha vida pegando essa coisa! Dá pra me ajudar aqui!?
- Ajudar como!?
- Primeiro, me apoiando, pra eu não fazer merda com esta porra deste machado lança imensa que pode matar gente!
- Tá. - A mãe de Flambarda começou a tentar se conter. - Desculpa.
- Bom, eu tenho que tentar por a minha vida nos eixos.
- E como você pretende fazer isso?
- Eu vou conversar com o aquele cará lá.
- Qual cara?
- Aquele que cê pediu pra conversar comigo.
- Que dia?
- Aquele dia que vcs revelaram as coisas pra mim
- Ah, acho que foi o professor Elimar.
- Isso! - A mente de Flambarda associou o nome a pessoa. - Ele mesmo.
- Eu acho que eu tenho o celular dele aqui.
- Me diz aí qual é o número.

Jéssica diz o telefone a Flambarda de modo pausado, dois números por vez, com o nono dígito separado dos outros oito. A filha disca no ritmo que sua mãe vai ditando os números e apressadamente põe o celular no ouvido, como se isso fosse fazê-lo dar sinal mais rápido. Certamente não era o caso, mas ela estava ansiosa para poder conversar com ele.

- Alô? Quem fala?
- Alô? Professor Elimar?
- Quem fala?
- Sou eu! Flambarda!
- Ah! Flambarda! Sim, sou eu! Que boa coincidência a faz ligar para mim?
- Professor eu preciso conversar com você.
- Me desculpe, mas eu tenho uma série de compromissos hoje. Eu tenho que trabalhar. Hoje é quarta-feira.
- Por favor, professor! Eu pago o café!
- Ok, você parece realmente desesperada.
- Sim! Eu tô!
- Tá bom, me encontra na entrada do CENPES na UFRJ. A gente almoça junto.
- Ok! Combinado! Já tô indo praí!

Jéssica já foi inquirir Flambarda conforme ela desligava o telefone.

- Tá tudo bem, filha?
- Tá, eu acho.
- Ele vai poder te ver?
- Eu vou almoçar com ele lá na UFRJ.
- Eu vou com você.
- Mãe! E os patrão filho da puta lá?
- Que se fodam eles.

Flambarda então deu de ombros. Não havia mais o que ser dito, ela não iria conseguir parar sua mãe. Ela realmente não queria conversar sobre o caos com a sua mãe porque ela é mãe! Ela vai querer protegê-la, e em algum lugar, lá no fundo de sua alma, a detetive sabia que iria ter que lidar com o mundo elemntal de novo. Só não sabia quando, e nem como. Isso a preocupava porque é o mesmo que assumir que o Rodney está certo. E se tem uma coisa que ela não gosta é justamente assumir que ele está certo e que existe destino.

Elas viajam em silêncio.Ambas com indumentária extremamente despojada, sem muitas firulas. Ambas de rabo de cavalo no cabelo por questão de praticidade, uma de all-star e a outra de sapatilha. Se a diferença de idade não fosse relativamente fácil de se notar, poderiam se passar por irmãs. Elas pegaram o metrô, com a integração porque de alguma forma essa era a forma mais fácil de se chegar lá, mesmo sendo um pouco mais caro. Flambarda pagou as passagens, ela ainda tinha uns trocados guardados, até porque, teve mais gente pagando coisa pra ela do que o oposto, apesar dela estar preocupada com a fatura do cartão de crédito do mês. Quando Flambarda percebeu que a viagem seria silenciosa, ela colocou o fone de ouvido pra escutar música, era It's a Kind of Magic do Queen. Até então o momento não parecia nem um pouco mágico.

Ao pegar o ônibus do metrô, Flambarda pede ao motorista para que a avise quando é pra saltar pra chegar no CENPES. Elas sentaram mais no fundo do veículo no mesmo banco duplo, Jéssica na janela, pra evitar que gente estranha sentasse junto, olhando pela janela pra ver o que se passava do lado de fora, e por onde estavam passando, e também olhando para as pessoas que estavam entrando, pra descerem caso vissem alguma pessoa estranha demais, coisa normal do Rio de Janeiro. A princípio nada de mais, só mais gente estranha e curiosa, porque se tem uma coisa que as universidades tem é gente estranha e curiosa. Flambarda estava também bastante concentada no fluxo elemental uma informação a mais que talvez fosse mais valiosa, apesar dela não saber exatamente como utilizá-la completamente.

O ônibus entrou no fundão, e rodou um pouco, passou pelo CCMN, pelo CT, rodou, passou pelo próprio CENPES, mas o motorista, concentrado, acabou não parando, e quando elas começaram a passar pelo hospital, elas resolveram descer, em silêncio, xingando consigo mesmas.

- E aí? O que a gente faz agora? - Perguntou Jéssica.
- Eu que devia perguntar! Tu que é minha mãe que sabe "dar" parada.
- Alguém tem que saber! Vamo perguntar! Ei Você! - Jéssica chamou um transeunte, era um homem, bastante genérico, nada que chamasse a atenção das duas. - Como a gente faz pra chegar no... como é o nome do lugar, filha?
- CENPES.
- Ah! - A pessoa responde, meio sem jeito. - Cês vão ter que pegar um ônibus pra chegar lá.
- Que merda. Vou ter pagar outra passagem. - Jéssica xingou
- Não, senhora! Que isso! Só pegar o interno. Pega o interno pra Reitoria.
- Tá. Valeu. - Disse Flambarda.
- Brigada - Disse Jéssica.
- Quer saber. - Disse a jovem, esperando o homem se afastar. - Eu vou é ligar pro professor.
- Boa.

Seria uma excelente idéia, se o telefone não estivesse sem sinal.

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